Plataformas populares entre adolescentes, como TikTok, Twitch, YouTube, Instagram e Kick, estão se tornando canais constantes de exposição a conteúdos de jogos de azar, muitas vezes disfarçados em anúncios coloridos e divertidos que oferecem promoções como giros gratuitos ou bônus. 

Uma pesquisa conduzida para a organização GambleAware pela consultoria Social Finance revelou a dimensão desse problema no Reino Unido: entre 634 crianças e jovens entrevistados, 87% relataram já ter se deparado com esse tipo de conteúdo online, evidenciando o alcance e a normalização do marketing de apostas entre menores.

🗞️ Leia também

• Michel Temer diz que legalização das apostas foi alternativa aos cassinos e admite dúvidas sobre recuar

• Maya Massafera compara apostas a álcool e defende publicidade do setor

Essa abordagem, segundo especialistas, torna o jogo atraente e “normal” para o público infantil, que ainda não possui maturidade para compreender os riscos. “A exposição constante a conteúdo sobre jogos de azar, gerado por influenciadores, normaliza o jogo entre crianças em idade escolar. E sabemos que a exposição precoce aumenta o risco de danos mais tarde na vida”, alerta Zoë Osmond, CEO da GambleAware.

Influenciadores cultivam curiosidade e desejo de pertencimento

O estudo mostrou também o papel central do marketing de influência na formação da curiosidade infantil em torno do jogo. Mais de um em cada seis participantes afirmou ter visto criadores de conteúdo promovendo jogos de azar. Outros relataram influenciadores compartilhando suas próprias apostas, códigos promocionais e até “dicas” de como jogar.

Quase metade das crianças que seguem esses criadores admitiu ter sido influenciada por eles, chegando a visitar sites de apostas e usar os códigos recomendados.

Para os pesquisadores, isso demonstra que o marketing de influência não apenas expõe os jovens aos jogos, mas também cultiva ativamente o engajamento, criando um desejo de pertencimento a um universo que aparenta ser divertido e lucrativo.

Exposição cresce com o tempo de tela e jogos online

Os riscos são ampliados pelo contexto digital atual. Entre 95% e 99% dos jovens de 13 a 17 anos possuem celulares, com um tempo médio diário de tela de 4,5 horas, que pode ultrapassar 10 horas entre os usuários mais assíduos.

Com essa presença constante nas redes, as oportunidades de exposição se multiplicam. A pesquisa mostra que um em cada três jovens já segue criadores que abordam jogos de azar.

Além disso, quem passa mais tempo em jogos online tem maior probabilidade de ser exposto a esse tipo de conteúdo, especialmente de criadores que misturam entretenimento com promoção de apostas. Essa sobreposição borra as fronteiras entre o jogo como diversão e o jogo como atividade financeira.

Restrições de idade não estão funcionando

Apesar de existirem regras que proíbem o acesso de menores a jogos de azar, elas se mostram ineficazes diante do ambiente digital atual.

“As crianças continuam expostas a conteúdos de jogos de azar devido às linhas tênues entre conteúdo pago, editorial e gerado pelo usuário; câmaras de eco orientadas por algoritmos; e regulamentação transfronteiriça inconsistente”, afirmou Zoë Osmond.

Ela defende que o poder público precisa atualizar urgentemente as normas para “acompanhar a era digital” e proteger os menores de um marketing que, segundo ela, atua de forma disfarçada e massiva em ambientes frequentados por crianças.

Problema global e difícil de controlar

As preocupações não se limitam ao Reino Unido. Pesquisas na Austrália mostraram que influenciadores costumam apresentar jogos de azar como algo “divertido” e aspiracional, confundindo os jovens sobre o que é publicidade. Já na Suécia, cerca de 80% dos grandes criadores do Twitch promovem sites ilegais.

Um levantamento britânico revelou ainda que influenciadores direcionam milhões de cliques mensais a plataformas de apostas não regulamentadas, parte de uma economia subterrânea que movimenta cerca de US$ 714 bilhões no mundo.

A Advertising Standards Authority (ASA), órgão que regula a publicidade no Reino Unido, atualizou recentemente suas diretrizes para enquadrar também postagens “orgânicas” de influenciadores. Porém, seus poderes sobre operadores estrangeiros e não licenciados são limitados.

Em outros países, como Brasil e Austrália, autoridades começaram a aplicar multas milionárias a influenciadores que promovem apostas ilegais numa tentativa de frear essa prática.

Urgência de ação para proteger o público infantil

Especialistas alertam que as técnicas atuais de publicidade digital estão um passo à frente das regulamentações, explorando a ingenuidade e o desejo de pertencimento de crianças e adolescentes.

Sem medidas mais firmes, cresce o risco de uma geração ser condicionada desde cedo a ver o jogo como algo normal e vantajoso, ignorando seus potenciais danos sociais, emocionais e financeiros.

Proteger os menores exige mais do que alertas: requer fiscalização, regras claras e a responsabilização de influenciadores e plataformas que continuam lucrando com a vulnerabilidade infantil.

🔞 O jogo não é a sua realidade e o resultado de sua aposta não te define como uma pessoa bem ou mal-sucedida. Procure ajuda psicológica e conheça o que é a Ludopatia